Dentre oficinas e debates apresentados no Simpósio Internacional de Contadores de Histórias, a mesa temática Palavras de griots: África e Brasil foi a que mais me ofereceu provocações e considerações, pois ao mesmo tempo que reforçou a figura quase mítica do griot, a desmistificou. Alertou para a utilização do termo griot fora do contexto cultural dos países africanos, nos quais para ser griot é preciso nascer em uma família (ou casta) de griots; esta foi a parte mais polêmica, pois uma das mais belas políticas públicas de valorização da cultura popular brasileira é a Ação Griô Nacional.
Isaac Bernat iniciou a mesa relatando que a contação de histórias é uma pequena parte do griot; este é o mediador, o conselheiro, o sábio pela palavra; aquele que sabe se comunicar com os ouvintes de forma simples e profunda.
Boniface Ofogo alertou para a necessidade de dignificar a figura do griot a nível mundial, pois este representa o que há de mais profundo em valores humanos. O griot é mais do que um artista completo, é um líder espiritual, um filósofo e, também, é a memória personificada de um povo. Em todos os povos africanos se encontrará essa figura da memória personificada, havendo um grande respeito por aqueles que manejam a memória coletiva. Ressaltou que, sendo o Brasil um país com profundas raízes africanas, deveria conhecer o que há de positividade na África, não apenas as imagens de miséria e guerras veiculadas pelos grandes meios de comunicação. Completou dizendo que, hoje no Ocidente, o ancião é um problema; contudos, nas sociedades africanas, ser ancião é ser profundamente valorizado.
Jean Michel Hernandez abordou, principalmente o processo de transmissão do saber musical na fabricação das koras e do aprendizado deste instrumento (sobre a kora, veja este vídeo de Toumani Djabaté).
A polêmica ficou a cargo de Benita Prieto, mediadora da mesa temática. Na opinião de Benita, é importante não se apoderar de uma figura que não é de sua cultura; para exemplificar, citou a Ação Griô Nacional que utiliza o termo griot fora do contexto clássico _ função hereditária, vinda de um sistema de castas.
Neste ponto a platéia se dividiu. Alguns mencionando que as palavras nada mais são que um rótulo, sendo importante a ação e não a nomeação; outros viram nesta fala uma crítica á Ação Griot (o que Benita deixou bem claro não ser). Benita sinalizou para o contador de causos brasileiro, que deveria ser considerado patrimônio imaterial, sendo uma figura da nossa cultura.
Da platéia, Muriel Bloch, contadora de histórias francesa convidada para o evento, alertou para a mitificação da figura do griot, que não corresponderia à realidade vista por ela, quando em visita a países africanos. Segundo Muriel, os griots competiam pelo mercado de trabalho, para cantar em casamentos e funerais. Isaac Bernat aparteou, esclarecendo que cantar em casamentos e funerais é função clássica de um griot, mas concordou que a globalização tem contri buído para a mercantilização da função.
Ofogo sinalizou para a necessidade de proteger a figura do griot, pois esta vem sendo alvo de desvalorização, sendo inclusive usada de maneira pejorativa; exemplificou que se um escritor escreve bem de um governo, é chamado de griot, de maneira de diminuí-lo. Continuou ressaltando que a proteção à figura dos griots deve evitar que estes sejam apanhados nas malhas do mercantilismo.
Assistindo ao debate, me peguei pensando em mais um caso de idéias fora do lugar: é possível falar em griots brasileiros ? Ao mesmo tempo, esta dúvida não significa crítica à Ação Griot Nacional, uma das mais belas políticas públicas de valorização da cultura popular. Esta complexidade, pontuada pela mesa temática é fundamental, em minha opinião, para que possamos fortalecer nossas raízes brasileiras, valorizando-nos com as nossas Palavras.
2 comentários:
Eliana querida,
Fiz link para seu blog.
Beijos
Oi Eliana,
Muito legais suas observações sobre o simpósio.
Isso mesmo não queremos descartar as ações e sim agregar valores e promover o debate construtivo.
Beijos,
Benita
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